OS CINCO CAMINHOS HINAYANA E MAHAYANA
དགྲ་བཅོམ་རང་རྒྱལ་ཐེག་པ།
por Geshe Nawang Dargye – LTWA -PARTE 1
– Veículos dos Ouvintes e Realizadores Solitários–
Quem tem potencial para seguir a prática de Mahayana (ou Tradição Sânscrita, como sugerido pelo Dalai Lama) deve fazê-lo, mas se não, deve recorrer ao Hinayana (ou Tradição Pali, como sugerido pelo Dalai Lama). Há um provérbio no Tibete que diz:
“Por que atravessar um rio duas vezes se você pode cruzá-lo apenas uma vez?”, e isto se aplica aqui, para quem segue o Hinayana deve mais tarde seguir o Mahayana antes de alcançar a realização final. Siga sua inclinação para um ou outro, e isto indicará o seu potencial para prática.
Embora se possa afirmar ser um mahayanista, nunca se deve menosprezar um hinayanista, pois ao seguir verdadeiramente as práticas mahayana, se apreciará profundamente o grande valor do caminho Hinayana (theg-dman gyi sa-lam). O termo “Mahayana” (theg-chen) refere-se a assumir o fardo de todos os seres sencientes sobre si mesmo, enquanto “Hinayana” (theg-dman) refere-se a assumir sobre si, somente o seu próprio fardo. Este último termo nunca se referiu a uma tradição específica, como Theravada. Os caminhos dos Sravakas e dos Pratyekabuddhas são os dois caminhos do veículo Hinayana. E ambos os caminhos, inclusive o caminho Mahayana envolvem no total, cinco caminhos ou estágios de crescimento espiritual.
1. OS CINCO CAMINHOS DOS OUVINTES “SRAVAKAS”[1] (ཉན་ཐོས་ཀྱི་ས་ལམ་ལྔ་)
1.1) O CAMINHO DA ACUMULAÇÃO (ཚོགས་ལམ།)
A fim de alcançar este primeiro caminho, deve-se desenvolver uma renúncia intensiva e um completo desapego ao samsara. Se alguém deseja abandonar o samsara, olhe para dentro de si mesmo, onde este realmente existe, e não para o mundo externo. O samsara é definido como o estado de “um ser que renasce nos vários estados de existência, dos infernos aos reinos dos deuses, devido a sua propulsão incontrolável lá pelo karma”. Um ser no samsara é como uma pessoa nua que carrega um feixe de espinhos amarrados às costas. Não pode haver liberdade até que a corda que liga uma pessoa ao samsara seja cortada e isto é feito por meio da liberação das forças das aflições aflitivas -klesha – e do karma. Ao compreender melhor o samsara em geral, sua própria existência samsarica e os sofrimentos do samsara, desenvolve-se um forte desejo de escapar do próprio corpo e de todo sofrimento. Quando este estado de mente é atingido, o caminho da acumulação (ཚོགས་ལམ།) é alcançado.
Para desenvolver tal renúncia, a pessoa deve estar livre dos apegos aos prazeres desta vida e das vidas futuras. Meditando sobre a lei de causa e efeito e sobre os sofrimentos de todos os estados de existência samsárica, a pessoa fica livre do apego aos prazeres das vidas futuras. A única maneira de alcançar a liberdade é tirando proveito do precioso corpo humano plenamente qualificado com as oito liberdades das 10 dotes. O samsara é como uma pessoa doente que nunca morre, um convidado que nunca chega, e um prisioneiro que nunca é libertado. Este estado samsárico nunca termina até que o esforço seja feito em aplicar meios habilidosos para atingir o objetivo de liberar-se.
Depois de desenvolver a renúncia, percebe-se que onde quer que se vá, há sofrimento, porque carregamos conosco esse alcance. Todos os ensinamentos de Dharma devem ser usados para ajudar neste desenvolvimento e para reconhecer claramente que o prazer samsárico nunca é satisfatório. As pessoas se iludem ao pensar que aqueles em níveis sociais mais elevados são mais felizes. Os reis pensam que os simples camponeses são os mais felizes dos seres e vice-versa. E o resultado disso chama-se inveja.
O caminho da caminho da acumulação (ཚོགས་ལམ།) tem três estágios. À medida que se avança através destes, completamente se abandona o apego ao próprio corpo, depois a todo o samsara e finalmente todas as percepções ou discernimentos mentais são eliminados. Durante a etapa inicial, ganha-se uma visão dos quatro objetos da presença mental (dran-pa’i nye-bar bzhag-pa bzhi)[2]. Durante a etapa intermediária alcança-se os quatro estados de abandono completo (yang-dag spong-ba bzhi)[3]. E durante a etapa final alcança-se os quatro estados de samadhi (rdzu-‘phrul-gyi rkang pa bzhi)[4] . Estas três realizações formam a fonte para:
- Todos os caminhos da sabedoria Búdica,
- Todos os caminhos da perseverança, e
- Todos os caminhos da concentração unifocada.
O praticante que atinge o estágio inicial vê o corpo humano como um ímã para o sofrimento e, portanto, é capaz de abandonar a maioria das aflições mentais-kleshas. Nesse ponto, a única preocupação desse praticante é a conquista da liberação. Os poderes milagrosos e a clarividência fazem parte dos resultados da realização deste caminho. Após tomar consciência destas conquistas dos Sravakas, não há desculpa para desprezar o caminho do Hinayana.
1.2) O CAMINHO DA PREPARAÇÃO (སྦྱོར་ལམ།)
Neste caminho o praticante desenvolve uma compreensão mais clara da vaziedade, pois a compreensão anterior estava impregnada de conceitos. O caminho é dividido em quatro estágios: “calor” (དྲོད།), pico (རྩེ་མོ།), paciência (ཛོད།), e as qualidades ‘mundanas’ suprema (ཆོས་མཆོག།), começando com a prática da meditação no estágio do “calor”. Através destes estágios, os cinco poderes (དབང་ལྔ།)[5] e as cinco forças (སྟོབས་ལྔ།)[6] são alcançados. Tudo isso será explicado em um momento posterior.
1.3) O CAMINHO DA VISÃO (མཐོང་ལམ།)
Com a realização deste caminho, ganha-se pura compreensão da vaziedade, desprovida de quaisquer falsos conceitos. O praticante torna-se então, um ser Arya e é capaz de abandonar todos os obscurecimentos mentais grosseiros, mas não as aflições mentais-kleshas- inerentes. Para abandonar estes, é necessário uma realização ainda mais profunda da vaziedade.
1.4) O CAMINHO DA MEDITAÇÃO (སྒོམ་ལམ།)
É seguindo este caminho que as emoções aflitivas inerentes são abandonadas. No início da prática, as aflições mentais-klehas-mais grosseiras são combatidas pelo poder mental mais fraco, então à medida que se avança neste caminho, as emoções aflitivas mais sutis são dissipadas por uma força cada vez mais forte da mente. Sempre que alguém experimenta sofrimento ou se sente perturbado, a emoção aflitiva surge.
Asanga escreveu:
‘Quando a emoção aflitiva surge, vem uma mudança da condição normal da mente, que é visível até mesmo no rosto“.
Passo a passo a pessoa abandona as emoções aflitivas do reino do desejo (འདོག་ཁམས་ཀྱི་ཉོན་མོངས་སྐོར་དགུ་), do reino da forma (གཟུགས་ཁམས་ཀྱི་ཉོན་མོངས་སྐོར་དགུ་) e do reino sem forma (གཟུགས་མེད་ཁམས་ཀྱི་ཉོན་མོངས་སྐོར་དགུ་). Há nove tipos de obscurecimentos em cada reino, que são divididos nos níveis de grande, médio e pequeno, depois novamente subdivididos em um total de nove níveis.
1.5) NADA MAIS A APRENDER (མི་སློབ་ལམ།)
Este caminho é alcançado quando todos estes obscurecimentos são abandonados completamente. A esse ponto o praticante torna-se um Arhat.
2. OS CINCO CAMINHOS DOS REALIZADORES SOLITÁRIOS “PRATYEKABUDDHAS[7]” (རང་རྒྱལ་གྱི་ས་ལམ་ལྔ་།)
A única diferença entre os caminhos dos Pratyekabuddhas e os dos Sravakas é que os Pratyekabuddhas acumulam méritos por muitas eras, enquanto os Shravakas não o fazem. Os Pratyekabuddhas são conhecidos por sua capacidade de transmitir ensinamentos sem usar palavras, e permanecerem sozinhos na floresta como o rinoceronte.
Do Livro “MENTAL DEVELOPMENT IN TIBETAN TRADITION – LTWA
By Geshe Geshe Nawang Dargye.
Tradução de @Bia Bispo 2020
OBS. Visto que essa tema é um pouco extenso, dividiremos em 4 partes: Hinayana (parte 1), Mahayana (Parte 2), os Dez Estágios do Bodhisattva (Parte 3) e o Estado Búdico (parte 4).
NOTAS:
[1] Bia: Ouvi sobre isso num ensinamento de Serkong Rinpoche e no site do Rigpa Shedra achei essa citação: A palavra sânscrita sravaka, significa “aquele que ouve e proclama”. Há duas explicações para isto:
– A primeira explicação é que os Sravakas primeiro ouvem as instruções de Buddha sobre ensinamentos como as quatro nobres verdades ou os doze elos da originação interdependente, e depois, por meio da reflexão e meditação destas instruções, alcançam sua realização de arhat. Uma vez que alcançam esse resultado, proclamam isso aos outros dizendo coisas como “O que tinha que ser feito, foi feito! Eu não conhecerei mais nenhuma existência” [em outras palavras, “ eu não renascerei mais na existência cíclica”].
– A segunda é que os Sravakas recebem ou ouvem ensinamentos sobre os mahayana de Buddha, e embora não os pratiquem, eles os retêm infalivelmente em suas memórias. Então, quando se encontram com aqueles que consideram ser recipientes adequados para o mahayana, eles apregoam os ensinamentos que eles memorizaram.
[2] དྲན་པ་ཉེ་བར་བཞག་པ་བཞི།; sâns.: catvari catvari. Os quatro objetos da presença mental ou contemplação plena.
- ལུས་དྲན་པ་ཉེ་བར་བཞག་པ།; sâns. kaya smrityupasthana. Contemplação plena do corpo.
- ཚོར་བ་དྲན་པ་ཉེ་བར་བཞག་བ། sâns. vedana. Contemplação plena dos sensações
- སེམས་དྲན་བཉེ་བར་བཞག་པ། sâns. citta. Contemplação plena da mente
- ཆོས་དྲན་པ་ཉེ་བར་བཞག་པ། sâns. dharma. Contemplação plena do Dharma.
[3] ཡང་དག་སྤོང་བ་བཞི།; sâns.: catvari samyak-prahanani. Os quatro abandonos perfeitos ou quatro esforços corretos. Uma seção dos trinta e sete fatores para a Iluminação.
- མི་དགེ་བ་སྐྱེས་པ་སྤོང་བ། abandono de não-virtudes que não foram geradas
- མི་དགེ་བ་མ་སྐྱེས་པ་མི་བསྐྱེད་པ། não geração de não-virtudes que ainda não foram geradas
- དགེ་བ་མ་སྐྱེས་པ་བསྐྐྱེད་པ། aumento das virtudes que têm sido geradas
- དགེ་བ་སྐྱེས་པ་སྤེལ་བ། esforçar-se para gerar virtudes que ainda não foram geradas.
[4] རྫུ་འཕྲུལ་གྱི་རྐང་པ་བཞི།; sâns.: catvaro rddhipadah. As quatro bases de poder sobrenaturais. Uma classe da divisão dentro dos trinta e sete fatores para a iIluminação; qualidades adquiridas por um Bodhisattva no grande nível do caminho da acumulação (tshogs-lam).
- འདུན་པའི་རྫུ་འཕྲུལ་ག་གྱི་རྐང་པ།; sâns. chanda rddhipada. Aspiração
- བརྩོན་འགྲུས་ཀྱི་རྫུ་འཕྲུལ་གྱི་རྐང་པ།; sâns. virya rddhipada. Esforço
- བསམ་པའི་རྫུ་འཕྲུལ་གྱི་རྐང་པ།; sâns. citta rddhipada. Pensamento
- དཔྱོད་པའི་རྫུ་འཕྲུལ་གྱི་རྐང་པ།; sâns. mimamsa rddhipada. Aanálise.
[5] Os cinco poderes dentre os trinta e sete fatores para a Iluminação.
- དད་པོའི་སྟོབས།; sâns. sraddha bala. O poder da fé
- བརྩོན་འགྲུས་ཀྱི་སྟོབས།; sâns. virya bala. O poder da perseverança entusiástica
- དྲན་པོའི་སྟོབས།; sâns. smriti bala. O poder da presença mental
- ཏིང་ངེ་འཛིན་གྱི་སྟོབས།; sâns. samadhi bala. O poder da da concentração
- ཤེས་རབ་ཀྱི་སྟོབས།; sâns. prajaa bala. O poder da sabedoria transcendente.
[6] As cinco forças ou poder de acordo com o treinamento mental em sete pontos
- དཀར་པོ་ས་བོན་གྱི་སྟོབས།; sâns. suklabija bala. O poder ou força das sementes brancas (a forte determinação de acumular méritos e eliminar os obstáculos a fim de desenvolver virtudes iluminadas)
- འཕེན་པའི་སྟོབས།; sâns. asaya bala. A força ou poder da intenção
- སུན་འབྱིན་པའི་སྟོབས།; sâns. dusana bala. A força ou poderda repulsão
- གོམས་པའི་སྟོབས།; sâns. abhyasa bala. A força ou poderda familiaridade
- སྨོན་ལམ་ག།; sâns. pranidhana bala. A força ou poder da oração.
[7] Bia: Ouvi sobre isso num ensinamento de Serkong Rinpoche e no site do Rigpa Shedra achei essa citação: De acordo com algumas das primeiras escolas Budistas e o Mahayana, os Pratyekabuddhas primeiro ouvem os ensinamentos de Buddha, depois estudam e refletem sobre os doze elos da originação interdependente e acumulam mérito por cem eras. Eles oram para renascer num mundo ao qual nenhum Buddha apareceu e alcançam a realização sem depender de um Mestre. [São famosos por ensinarem sem usar a palavra]. Geralmente eles ensinam de forma visual e não verbal; por exemplo, exibindo milagres como transformar a parte superior de seus corpos em fogo e a parte inferior em água etc.
Eles são às vezes chamados de “Buddhas intermediários” e a iluminação deles é considerada uma forma de realização superior à dos Sravakas por duas razões: 1. suas acumulações de méritos e 2. suas acumulações de sabedoria transcendente.
Os Sravakas acumulam méritos por até dezesseis vidas, enquanto os Pratyekabuddhas acumulam méritos por cem eras. Em relação a acumulação da sabedoria transcendente, os Sravakas só compreendem um tipo de ausência de entidade intrínseca – aquela da ausência de entidade intrínseca do indivíduo, enquanto os Pratyekabuddhas, além dessa compreensão, eles também tem uma compreensão mediana da ausência de entidade intrínseca dos fenômenos. Por estas mesmas razões, a realização do Pratyekabuddha é considerada menor em relação a Iluminação suprema daqueles que seguem o caminho do Bodhisattva. Um Bodhisattva acumula méritos por três incontáveis eras e realiza plenamente ambos os tipos de ausência de entidade intrínseca.
Existem dois tipos de Realizadores Solitários:
– aqueles com faculdades mais tênues que vivem em comunidades, semelhantes ao papagaio, (sâns. vargacarin) [Eles são chamados “semelhantes a papagaios” porque permanecem juntos em grupos, ao contrário dos Arhats “semelhantes a rinocerontes” Pratyekabuddha que ficam sozinhos], e
– aqueles com faculdades mais aguçadas que vivem sozinhos, como os rinocerontes (sâns. khaḍgavisanakalpa).