OS DEZ ESTÁGIOS OU BHUMIS DO BODHISATTVA
por Geshe Nawang Dargye – LTWA
[Com o comentário do Dasabhumika Sutra] – PARTE 3
Para compreender estes estágios, é preciso primeiro compreender as seis perfeições (generosidade, ética moral, paciência, concentração, sabedoria transcendente (shes-rab ཤེས་རབ།[1] [1]) e as quatro Perfeições adicionais de: meios hábeis ou métodos , determinação, poder espiritual e sabedoria prístina (ye-shes ཡེ་ཤེས།). Estas quatro são, de fato, aspectos da sexta perfeição – sabedoria. Porém, a sabedoria transcendente, refere-se ao conhecimento de tudo o que há para ser conhecido é a décima Perfeição e a causa direta da iluminação. A seguir estão as explicações breves sobre os dez Estágios do Bodhisattva (byan-sa bcu):
- Beatitude Perfeita (Tib. རབ་ཏུ་དགའ་བ་; Sâns. pramuditābhūmi). Este é o regozijo de realizar um aspecto parcial da verdade. Com a realização deste estágio, a pessoa se sente como um mendigo que encontrou um tesouro, pois percebe que seus desejos para si mesmo e para os outros podem ser realizados.
Comentário do Daśabhūmika Sūtra – O Sutra dos Dez Estágios.
O Primeiro Estágio, chamado “Beatitude Perfeita”, é alcançado com a primeira percepção direta da vaziedade (Sunyata) e é simultâneo à entrada no terceiro dos cinco caminhos, o caminho da visão. É chamado de “Beatitude Perfeita” porque o Bodhisattva trabalha nas perfeições da generosidade e desenvolve a capacidade de dar tudo sem arrependimento e sem pensar em elogios ou recompensas (para si mesmo). Todos os fenômenos são vistos como vazios de existência intrínseca e sujeitos à decadência, sofrimento e morte, motivos pelos quais o Bodhisattva perde todo apego a estes. Segundo Tsong Khapa, o Bodhisattva do primeiro estágio compreende diretamente que o indivíduo não existe por si próprio, não possui natureza independente. Devido a isso, o Bodhisattva elimina a falsa ideia de que os cinco agregados constituem o indivíduo intrinsecamente existente. Ele também remove completamente as predisposições para uma ética corrompida, de maneira que estas não surgirão novamente. Apesar de ter percebido direta e corretamente a vaziedade, o Bodhisattva, no primeiro estágio, é motivado principalmente pela fé. Ele treina na ética para purificar sua mente de negatividade e assim se prepara para o cultivo da absorção meditativa que vem no segundo nível. |
- Imaculado (Tib. དྲི་མ་མེད་པ་; Sâns. vimalābhūmi). Neste estágio, todos os atos não-virtuosos são abandonados.
Comentário do Daśabhūmika Sūtra – O Sutra dos Dez Estágios.
Segundo estágio, chamado “Imaculado”. Neste estágio, o Bodhisattva aperfeiçoa a ética e supera todas as tendências para o engajamento em ações negativas. Seu controle torna-se tão completo que mesmo em sonhos ele não têm pensamentos imorais. De acordo com Tsong Khapa para tal Bodhisattva,”todas as ocasiões, desperta e sonhantes, seus movimentos ou atividades de corpo, fala e mente são livres até mesmo de infrações sutis… ele realiza os três caminhos das ações virtuosas: com seu corpo ele abandona-matar, roubar e cometer conduta sexual errônea; com sua fala abandona as quatro ações – mentir, conversa difamatória, abusos por meio da palavra e fofoca ou conversa fiada; e com mente ele abandona os três últimos – cobiça, pensamentos prejudiciais e visões errôneas. Ele não apenas se abstém do que é proibido, mas também adota todas as realizações positivas relacionadas à ética apropriada.” E de acordo com Nagarjuna, A segunda é chamada de Imaculada Por causa disso, a mente do Bodhisattva se torna purificada e equânime, o que é um pré-requisito para o treinamento nos quatro “dhyanas” (absorções meditativas) e nos quatro “arupa jhanas” (absorções sem forma)[2]. |
- Resplandecente e Luminoso (Tib. འོད་བྱེད་པ་; Sâns. prabhākarībhūmi). Durante este estágio, se alcança vislumbres da iluminação, que, com o nascer do sol elimina a escuridão, assim esses vislumbres dissipam muitas aflições negativas e é como se irradiasse a luz da sabedoria.
Comentário do Daśabhūmika Sūtra – O Sutra dos Dez Estágios.
Tsong Khapa afirma que o terceiro estágio é chamado de “Resplandecente” porque quando é alcançado “o fogo da sabedoria que queima todo o combustível dos objetos do conhecimento surge junto com uma luz que, por natureza, é capaz de extinguir todas as elaborações dualísticas durante a absorção meditativa.” Neste estágio, o Bodhisattva cultiva a perfeição da paciência. Sua equanimidade se torna tão profunda que mesmo que se alguém… cortasse não apenas a carne do corpo desse Bodhisattva, mas também seus ossos, não em grandes pedaços, mas em pedacinhos, continuadamente e demorando muito, esse Bodhisattva não se zangaria com o mutilador. O Bodhisattva percebe que seu atormentador é motivado por pensamentos [emoções] aflitivos e está semeando sementes para seu próprio sofrimento futuro. Como resultado, o Bodhisattva não sente raiva, mas uma profunda tristeza e compaixão por tal pessoa cruel, que desconhece como karma opera. Os “formandos” do terceiro estágio superam todas as tendências ao ódio e nunca reagem com ira (ou mesmo aborrecimento) a qualquer ato ou palavra prejudicial. Ao contrário, a equanimidade de tal Bodhisattva permanece constante e todos os seres sencientes são vistos com amor e compaixão: Todo o ódio e rancor recai sobre a pessoa que os gera, e eles não fazem nada para eliminar os danos que já experimentaram. Eles são contraproducentes na medida que destroem a sua própria paz mental e constroem situações futuras desfavoráveis. Não há nada a se ganhar com o ódio e o rancor, a vingança nada faz para mudar o passado, e com essa compreensão o Bodhisattva evita as emoções aflitivas. Neste estágio, o Bodhisattva também treina nas quatro meditações de forma, nas quatro meditações sem forma, e nas quatro imensuráveis, e nos conhecimentos superiores. |
- Radiante (Tib. འོད་འཕྲོ་ཅན་; Sâns. arciṣmatībhūmi). Neste estágio a luz da compreensão da vaziedade irradia em todas as direções e pode ser usada de várias maneiras.
Comentário do Daśabhūmika Sūtra – O Sutra dos Dez Estágios.
Nesse quarto estágio, o “Radiante”, o Bodhisattva cultiva a perfeição do esforço e elimina as aflições mentais. De acordo com Wonch’uk[3], este estágio tem esse nome porque o Bodhisattva “emite constantemente o brilho da sabedoria sublime [a sabedoria que realiza a vaziedade]”. Ele também cita o Sutra Ornamento do Mahayana de Maitreya, onde explica que o Bodhisattva neste estágio queima os obscurecimentos aflitivos à liberação [ཉོན་སྒྲིབ་ nyon drib] e os obscurecimentos à onisciência [ཤེས་སྒྲིབ་ shes drib] com o brilho de sua sabedoria. Ele entra em absorções meditativas progressivamente mais profundas e como resultado atinge uma poderosa adaptabilidade mental. Isto elimina a preguiça e aumenta sua capacidade de praticar meditação por longos períodos de tempo. Ele destrói as aflições profundamente enraizadas e cultivam os trinta e sete fatores para a Iluminação. Por meio do treinamento nestas trinta e sete práticas, o Bodhisattva desenvolve grande habilidade nas absorções meditativas e cultivam a sabedoria, enquanto enfraquecem as concepções ou ignorâncias artificiais ou imputadas [ཀུན་བརྟགས་ཀྱི་མ་རིག་པ་ kun tag ma rig pa] e aquelas inatas ou co-emergentes [ལྷན་སྐྱེས་ཀྱི་མ་རིག་པ་ lhen kye ma rig pa] de uma verdadeira existência intrínseca. |
- Difícil de Subjugar/Superar (Tib. ཤིན་ཏུ་སྦྱང་དཀའ་བ་; Sâns. sudurjayābhūm). Durante este estágio, todos os obstáculos difíceis para o alcance da meditação são superados.
Comentário do Daśabhūmika Sūtra – O Sutra dos Dez Estágios.
O quinto estágio é chamado de “Difícil de Subjugar” porque envolve práticas que são muito árduas e exigem muito esforço para serem aperfeiçoadas. É também chamado de “Difícil de Superar” porque, quando se completa o treinamento desse nível, o Bodhisattva tem uma sabedoria e um discernimento tão profundo que são difíceis de superar ou minar. De acordo com Nagarjuna: O quinto é chamado de Extremamente Difícil de Superar Neste estágio, o Bodhisattva cultiva a perfeição do samadhi. Ele desenvolve fortes poderes de estabilização meditativa e elimina as tendências à distração. Ele alcança a concentração unifocada e aperfeiçoam a calma mental. Ele também penetra totalmente nos significados das quatro nobres verdades (sofrimento, origem, cessação e caminho] e das duas verdades [verdade convencional e verdade última] e percebem todos os fenômenos como vazios de existências intrínsecas, transitórios e sujeitos ao sofrimento. |
- Diretamente Manifesto (Tib. མངོན་དུ་གྱུར་བ་; Sâns. abhimukhībhūmi). Neste estágio a compreensão do samsara e do nirvana agora se torna cada vez mais clara,[a suprema sabedoria começa a se manifestar].
Comentário do Daśabhūmika Sūtra – O Sutra dos Dez Estágios. O sexto estágio é chamado de “Diretamente Manifesto” porque o Bodhisattva percebe direto e claramente o funcionamento da originação interdependente e compreende diretamente o “sem sinais ou sem conceitos” (Tib. མཚན་མ་མེད་པ། mtshan ma med pa; Sâns. Animitta). “Sem sinais” refere-se ao fato de que os fenômenos parecem possuir verdadeiramente suas qualidades aparentes por meio de sua própria natureza, mas quando essa aparência são examinadas, percebe-se que todas as qualidades que possuem são meramente imputadas mentalmente e nenhuma parte da natureza dos objetos pode ser caracterizada como tal. Como resultado dessa compreensão, o Bodhisattva manifesta a sabedoria meditativa e evita o desejo pela existência cíclica ou pelo nirvana. Tendo superado todos os desejos, o Bodhisattva neste estágio pode atingir o nirvana, mas por causa da força da mente do iluminação [bodhicitta], ele decide permanecer no mundo a fim de beneficiar os seres sencientes. Ele cultiva a Perfeição da Sabedoria, por meio da qual percebem todos os fenômenos como carentes de existência inerente, como sendo semelhantes aos sonhos, ilusões, reflexos ou objetos criados mágicamente. Todas as noções de “eu” e “outro” são transcendidas, juntamente com as concepções de “existência intrínseca” e “inexistência intrínseca”. No sexto estágio, o Bodhisattva permanece na contemplação da talidade, com a mente que não é perturbada por ideias falsas. |
- Ido Além (Tib. རིང་དུ་སོང་བ་; Sâns. duraṅgamabhūmi). Durante este estágio, se ergue da motivação hinayana. Em uma centésima parte de um instante (sendo um instante a duração de um estalar dos dedos) é possível ingressar e sair da meditação sobre a vaziedade.
Comentário do Daśabhūmika Sūtra – O Sutra dos Dez Estágios.
No sétimo estágio, “Ido Além”, o Bodhisattva desenvolve a capacidade de contemplar “sem sinal” de maneira ininterrupta e ingressar em absorções meditativas avançadas por longos períodos de tempo, passando assim, para além dos caminhos mundanos e supramundanos dos Sravakas e Pratyekabuddhas (Ouvintes e Realizadores Solitários). Por esta razão, este estágio é chamado de “Ido Além”. De acordo com Nagarjuna: O sétimo é o “Ido Além” porque o número Neste estágio, o Bodhisattva aperfeiçoa os métodos hábeis na meditação e prática (Tib.ཐབས་ལ་མཁས་པ། thabs la mkhas pa; Sâns. Upaya-Kausalya), que é a capacidade de adaptar inteligentemente suas táticas de ensino de acordo com as propensões mentais e necessidades de cada indivíduo. Ele também desenvolve a capacidade de conhecer os pensamentos dos outros e em cada momento é capaz de praticar todas as perfeições. Todos os seus pensamentos e ações são livres de aflições mentais e ele age constantemente de forma espontânea e eficaz para o benefício dos seres. |
- Inabalável (Tib. མི་གཡོ་བ་; Sâns. acālabhūmi). Neste estágio, o pensamento do praticante se torna firme e impassíveis aos preconceitos perturbadores, [ou seja, a pessoa permanece firmemente na verdade do Caminho do Meio –a vaziedade–་ e não é perturbado por nada].
Comentário do Daśabhūmika Sūtra – O Sutra dos Dez Estágios.
O oitavo estágio é chamado de “Inabalável” porque o Bodhisattva supera todas as aflições mentais relativas aos “sinais” [às aparências] e sua mente está sempre e completamente absorvida pelo Dharma. Neste estágio, o Bodhisattva alcança o nirvana. De acordo com Nagarjuna: O oitavo é o “Inabalável”, o estágio jovial, Visto que ele está plenamente familiarizado com a ausência de sinal [aparência], sua mente não é abalada por conceitos de sinais [aparências]. Diz-se que o oitavo estágio do Bodhisattva é chamado de “irreversivel”, porque não há mais nenhuma possibilidade de que ele possa vacilar no caminho ou recuar. Ele está destinado ao Estado Búdico pleno, e não há mais nenhuma inclinação em busca do nirvana para si próprio. Ele cultiva a “perfeição da aspiração”, o que significa que se compromete a cumprir vários votos, devido aos quais acumula as causas para outras virtudes. Embora resolva trabalhar em benefício dos seres sencientes e mergulhe no universo com sentimentos de simpatia para com todos os seres, tais Bodhisattvas transcenderam qualquer tendência de compreensão errônea sobre a “ausência de entidade intrínseca” – anatta. Sua compreensão da vaziedade é tão completa que anula as aflições mentais inatas [ཉོན་མོངས་ལྷན་སྐྱེས། nyon mongs lhen skye], e a realidade [a maneira de existir dos fenômenos] aparece sob uma luz completamente nova. Ele entra em meditação sobre a vaziedade com pouco esforço. Neste estágio, o Bodhisattva é comparado a uma pessoa que despertou dos sonhos, e todas suas percepções são influenciadas por esta nova consciência. Ele atinge o estado meditativo chamado “paciência em relação à ausência de uma origem” (Tib. མི་སྐྱེ་བ་ལ་བཟོད་པ། mi skye ba la bdzod pa; Sâns. anutpada ksanti), devido ao qual não pensam mais em termos de causas inerentes ou ausência de causalidade inerente. Ele também desenvolve a capacidade de se manifestar de várias formas a fim de instruir os seres sencientes. A compaixão e os meios habilidosos são automáticos e espontâneos. Não há necessidade de planejar ou contemplar a melhor forma de beneficiar os outros, uma vez que o Bodhisattva do oitavo estágio sempre reage automaticamente e corretamente a cada situação. |
- Intelecto Perfeito (Tib. ལེགས་པའི་བློ་གྲོས་; Sâns. sādhuṃatībhūmi). As palavras [ensinamentos], seus significados são compreendidas durante este estágio.
Comentário do Daśabhūmika Sūtra – O Sutra dos Dez Estágios.
A partir deste ponto, o Bodhisattva se move rapidamente em direção ao despertar. Antes deste estágio, o progresso era comparativamente lento, como o de um barco sendo rebocado em direção a um porto. Do oitavo ao décimo estágio, no entanto, o Bodhisattva dá enormes passos em direção ao Estado Búdico, como um navio que chega ao oceano e desenrola todas suas velas. No nono estágio, o Bodhisattva compreende plenamente os três veículos – Ouvintes, Realizadores Solitários e Bodhisattvas – e aperfeiçoa a capacidade de ensinar a doutrina. De acordo com o Sutra desvendando o Pensamento: Devido ao alcance da ausência completa de falhas e da inteligência muito extensa em termos de maestria no ensinamento da doutrina em todos os aspectos, o nono nível é chamado de “Perfeito Intelecto”. O Bodhisattva do nono estágio também adquire os “quatro conhecimentos analíticos” – dos conceitos fundamentais, significado, gramática e explanação. Devido a isso, ele desenvolve eloquência e habilidade maravilhosa na apresentação dos ensinamentos teóricos. Sua inteligência supera a de todos os humanos e deuses, e ele compreende todos os nomes, palavras, significados e idiomas. Ele pode compreender qualquer pergunta de qualquer ser. Ele também tem a capacidade de responder todas as perguntas com um único tom de palavra, e será entendido por cada ser de acordo com sua capacidade intelectual. Neste estágio, ele também cultiva a perfeição da virya[4], o que significa que, devido à força de seu domínio dos quatro conhecimentos analíticos e sua meditação, ele é capaz de desenvolver as paramitas energeticamente e de praticá-las continuamente sem se cansar. |
- Nuvem do Dharma (Tib. ཆོས་ཀྱི་སྤྲིན་; Sâns. dharmameghaābhūmi). Assim como a chuva cai de uma nuvem levando as colheitas à fruição, alguém com esta realização é motivado pela nuvem de amor e misericórdia a ajudar e ensinar os outros, aproveitando a própria experiência.
Comentário do Daśabhūmika Sūtra – O Sutra dos Dez Estágios.
No décimo estágio, o Bodhisattva supera os traços mais sutis das aflições mentais. Assim como uma nuvem que derrama chuva sobre a terra, tal Bodhisattva espalha o Dharma em todas as direções, e cada ser senciente absorve o que precisa para crescer espiritualmente. Assim, Nagarjuna afirma que: O décimo é a Nuvem do Dharma porque Neste estágio, o Bodhisattva entra progressivamente em absorções meditativas mais profundas e desenvolve poderes ilimitados com relação a fórmulas mágicas. Ele cultiva a perfeição da sabedoria sublime, o que, de acordo com Asanga, lhe permite aumentar essa sua sabedoria sublime. Isto, por sua vez, fortalece as outras perfeições. Como resultado, ele se estabelece na alegria da doutrina. o Bodhisattva adquire um corpo perfeito e sua mente é purificada dos traços mais sutis das aflições. Ele se manifesta de formas ilimitadas para o benefício dos seres sencientes e transcende as leis ordinárias do tempo e do espaço. Ele é capaz de colocar os inteiros sistemas de mundos em um único poro sem precisar diminuí-los ou aumentar o tamanho do poro. Quando ele faz isso, os seres que habitam esses mundos não sentem desconforto e apenas aqueles que são Bodhisattvas avançados percebem. Neste nível, o Bodhisattva também recebe uma forma de iniciação de inumeráveis Buddhas. Isto é chamado de “imensos Raios de Luz”, porque o brilho de tal Bodhisattva brilha em todas as direções. Esta iniciação ajuda o Bodhisattva neste estágio a remover os obstáculos remanescentes à onisciência e lhe dá mais confiança e força. No momento final desta estágio, ele entra em um estado meditativo chamado “Estabilização Meditativa Indestrutível (Tib. རྡོ་རྗེ་ལྟ་བུའི་ཏིང་ངེ་འཛིན། rdor rje lta bu’i ting nge ‘dzin), na qual os obstáculos mais sutis remanescentes [que impedem o alcance do] Estado Búdico completo, são superados. A esse ponto, a partir desta concentração, ele emerge como um Buddha. |
O primeiro estágio envolve um desenvolvimento da sabedoria aliada à prática perfeita da primeira perfeição (generosidade) e os estágios seguintes também correspondem às nove perfeições restantes. Cada estágio do Bodhisattva é composto das três fases seguintes:
(a) A fase ininterrupta, livre de todas as interferências.
(b) A fase de separação.
(c) A fase de pós-meditação
Durante a primeira fase, superam-se as aflições mentais ou obstáculos específicos; durante a segunda, obtém-se total liberação em relação a estas; e durante a terceira, surge a meditação sobre a vaziedade e adquire méritos físicos em preparação para avançar para o próximo estágio.
A definição da fase ininterrupta é “a sabedoria da perfeita compreensão da vaziedade, que destrói a crença na existência de uma entidade auto-suficiente”. Esta fase forma um elo ininterrupto entre o caminho da visão e o caminho da concentração. A última fase do caminho da preparação e as fases inicial e intermediária do caminho da visão são todas alcançadas durante um período de meditação.
Durante cada uma das fases, certos tipos de aflições mentais são abandonadas, ou seja, em cada fase são eliminadas as aflições mentais respectivas (Tib. རང་གི་ངོས་སྐལ་གྱི་སྤོང་བ། rang-gi ngos-skal-gyi spong ba). Em cada fase do processo gradual vão sendo eliminadas as aflições mentais cada vez mais sutis, todas essas aflições não são eliminadas de uma só vez.
Os Obscurecimentos aflitivos também conhecidos como os “obscurecimentos à liberação” liberação (ཉོན་སྒྲིབ་ nyon sgrib) relacionados a natureza da vaziedade, são aqueles que são eliminados durante a etapa inicial da primeira fase, e durante a segunda fase, se inicia o abandono do obscurecimento a Iluminação(ཤེས་སྒྲིབ་ shes sgrib) relacionados à crença da existência de uma entidade independente do “eu”. Visto que o primeiro tipo de obscurecimento é de natureza mais grosseira, este é mais fácil de ser abandonado do que o segundo. A princípio, acredita-se na existência de um “eu” verdadeiro e independente, mas ao reconhecer a [sua] impermanência surge a dúvida. Isso é comparado a quando se vê pela primeira vez, um monte de pedras sobre uma montanha distante, podendo confundi-lo com uma pessoa. Mas, devido a dúvida, a pessoa se aproxima cada vez mais até que finalmente se descobre a realidade verdadeira. Da mesma forma, estes obscurecimentos são dissipados pela aplicação da lógica da Análise em Quatro Pontos.[5] No entanto, estes obscurecimentos não são todos abandonados durante a fase inicial. Estes podem sempre retornar até que se consiga erradicá-los completamente durante a segunda etapa.
Durante o caminho da visão, se alcança oito tipos de paciência (བཟོད་པ་བརྒྱད་ bzod pabrgyad), que atuam como forças adversárias contra os obscurecimentos que se tem em relação às quatro nobres verdades. Destas, as quatro primeiras (ཆོས་བཟོད་ chos-bzod) são as forças adversárias ao obscurantismo do reino do desejo, e as quatro últimas (རྗེས་བཟོད་ rjes bzod) são os oponentes ao obscurantismo do reino da forma e do reino sem forma. Estes últimos só são aplicados depois que os obscurantismos do reino do desejo tiverem sido subjugados.
Desta forma, ao todo, são alcançados oito tipos de compreensões (ཤེས་པ་བརྒྱད་ shes pa brgyad). Os primeiros quatro (ཆོས་ཤེས་ chos-shes) são resultados do abandono dos obscurantismos relacionado ao reino do desejo, e os últimos quatro (རྗེས་ཤེས་ rjes-shes), do abandono dos obscurantismos relacionado ao reino da forma e do reino sem forma. Durante o caminho da meditação, há cento e oito dos obscurantismos relacionados inatos a serem abandonados, e estes são divididos em nove categorias, que vão dos obscurantismos mais grosseiro ao mais sutis.
Estas categorias são nomeadas da seguinte forma:
(1) o grosseiro do grosseiro,
(2) o intermediário do grosseiro,
(3) o sutil do grosseiro,
(4) o grosseiro do intermediário,
(5) o intermediário do intermediário,
(6) o sutil do intermediário,
(7) o grosseiro do sutil ,
(8) o intermediário do sutil, e
(9) o sutil do sutil .
Todos os obscurantismos grosseiro dos grosseiros são abandonados durante a primeira fase, o intermediário dos grosseiros durante a segunda, e assim por diante, com uma categoria correspondente a cada uma das estágios. Ao final do caminho da meditação, todos os (tib. ཉོན་མོངས་ཀྱི་སྒྲིབ་པ་; sâns. kleśāvarana) obscurecimentos aflitivos (ou obscurecimentos à liberação) são eliminados.
O caminho ininterrupto (do final do continuum mental) no décimo estágio (རྒྱུན་མཐའི་བར་ཆད་མེད་ལམ་ rgyun mtha’i bar chad med lam) é seguido por uma separação completa de todos os (tib. ཤེས་སྒྲིབ་; sâns. jñeyāvarana) obscurecimentos do que resta a ser conhecido (ou obscurecimentos a onisciência ou iluminação), e a esse ponto se alcança a iluminação, que vai além deste estágio final.
Do Livro “MENTAL DEVELOPMENT IN TIBETAN TRADITION – LTWA
By Geshe Geshe Nawang Dargye
ADENDUM 1:
Como parte do caminho do Bodhisattva.
A passagem pelos estágios “bhumis” e pelos cinco caminhos começa com a Bodhicitta, o desejo de libertar todos os seres sencientes. A Bodhicitta de aspiração torna-se Bodhicitta de ação após o compromisso real com os votos do Bodhisattva. Com estes passos, antes de chegar aos dez estágios, o Bodhisattva percorre os dois primeiros dos cinco caminhos Mahayana:
- O caminho da acumulação (ཚོགས་ལམ།) e
- O caminho de preparação (སྦྱོར་ལམ།)
Os dez estágios do Bodhisattva estão agrupadas dentro dos três caminhos Mahayana como segue:
- Estágio 1: O caminho da visão (མཐོང་ལམ།)
- Do estágio 2 ao 7: O caminho da meditação
- Do estágio 8 ao 10: O caminho do nada mais aprender
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ADENDUM 2: Existem também os Seis bhumis [estágios] no Yogacarabhūmi
- O estágio de praticar com averiguação (Sâns. adhimukticaryābhūmi, Tib. མོས་པས་སྤྱོད་པའི་ས་)
- O estágio de pura convicção sublime (Sâns. śuddhādhyāśayabhūmi; Tib. ལྷག་པའི་བསམ་པ་དག་པའི་ས་),
- O estágio de engajar-se nas práticas (Sâns. caryāpratipattibhūmi. Tib. སྤྱོད་ལ་འཇུག་པའི་ས་),
- O estágio da certeza (Sâns. niyatabhūmi. Tib. ངེས་པར་གྱུར་པའི་ས་),
- O estágio de praticar com certeza (Sâns. niyatacaryābhūmi. Tib. ངེས་པའི་སྤྱོད་པའི་ས་), e
- O estágio de alcançar a perfeição (Sâns. niṣṭhāgamanabhūmi. Tib. མཐར་ཐུག་པར་འགྱུར་བའི་ས་).
Tradução de @Bia Bispo 2021. Possa tudo ser de benefício a incontáveis seres.
NOTAS:
[1][1] Essa Sabedoria refere-se a sabedoria que realiza diretamente a vaziedade ou ausência de entidade intrínseca.
[2] Arupa jhana é um termo budista que se refere aos quatro níveis sucessivos de meditação. Essas meditações são todas “meditações sem forma”, ou meditações sobre objetos não-materiais, e, como tal, são consideradas mais desafiadoras de se alcançar do que as jhanas rupa (com forma). Estas só podem ser alcançadas uma vez que as rupas jhanas (meditações com formas) foram assimiladas.
[3] Foi um monge acadêmico, expatriado coreano, que viveu na China do século VII.
[4] É um termo budista geralmente traduzido como “energia”, “diligência”, “entusiasmo”, ou “esforço”. Este pode ser definido como uma atitude de prazer em se envolver em ações virtuosas benéficas, e funciona para fazer com que se realize ações benéficas ou positivas.
[5]Explicação de Alex Berzin. Geralmente é chamada de “análise de quatro pontos”, que é usada com uma linha de raciocínio chamada “nem um nem muitos”. O primeiro ponto é reconhecer o objeto a ser refutado; o segundo é ter uma convicção de que a linha de raciocínio para refutá-lo, ou seja, “nem um nem muitos”, na verdade refuta o objeto; o terceiro ponto é refutar “um”; e o quarto é refutar “muitos”. A conclusão é que, porque o falso “eu” [ao qual imputam uma existência intrínseca independente] não é nem um e nem muitos, o falso “eu” não existe de forma alguma.