As Eras ou Yugas

 AS ERAS OU YUGAS

 

De acordo tanto com as fontes do Abhidharma quanto as do Kalahchakra, a visão da origem da vida que encontramos pode ser descrita como a de uma queda ou descida. Os primeiros humanos são descritos como possuidores das características dos deuses, com corpos feitos de luz e sem necessidade do sustento da comida e assim por diante. Essa visão deriva da visão panindiana da evolução histórica, ou melhor, da involução, em que os humanos passam por quatro yugas ou eras.

– primeiramente veio a era dos preceitos perfeitos Satya Yuga (também conhecida como Krita Yuga) a “idade de ouro”, no decorrer da qual tudo era perfeito e os humanos tinham atributos divinos. Não havia crime nem necessidade de comida, e a expectativa da vida humana era de milhares de anos; em seguida,

– a era de manter três preceitos (treta yuga); depois, a era de manter dois preceitos (dvapara yuga), onde os homens progressivamente se tornaram menos parecidos com os deuses e a vida foi encurtada e finalmente,

– a era do conflito (kali yuga) , a era da degeneração durante a qual a vida humana foi reduzida para cem anos no máximo. Esta é a nossa era, que é caracterizada principalmente por discórdia e conflito. É também chamada a época da disseminação das “cinco degenerações”[i] e é considerada uma época inferior.

A era dos preceitos perfeitos era aquela em que os seres humanos praticavam naturalmente o Dharma e não se envolviam em nenhum ato imoral (Krita Yuga).

A era na qual ocorreu o primeiro ato imoral no mundo foi a era de manter os três preceitos, e não a de manter todos os preceitos (treta yuga).

Quando os dois tipos de ações não virtuosas surgiram, foi a era de manter dois preceitos (dvapara yuga).

Quando todos os tipos de atos imorais não virtuosos surgiram, iniciou-se a chamada era do conflito (kali yuga). Com relação a essas explicações, há consenso entre todas as escolas indianas.

Alguém poderia questionar: em primeiro lugar, de onde vieram os humanos da idade de ouro? Para isso é bom lembrar de outro aspecto importante da cosmologia budista, a teoria das três esferas da existência – o reino do desejo, o reino da forma e o reino sem forma. Os últimos dois reinos pertencem exclusivamente aos deuses, enquanto o reino do desejo, ou dos sentidos, é povoado por seres de todos os seis tipos de renascimento: humanos, animais, seres do inferno, espíritos, deuses e semideuses. Desse modo, quando um novo universo físico surge, é a queda dos seres que se encontram nos reinos celestiais que conduz ao surgimento de uma nova vida.

Por conseguinte, para os budistas, a presença da vida em outro lugar (no universo) – uma questão pela qual a ciência moderna é muito fascinada – é inquestionável. Dado o seu enorme alcance cosmológico, com múltiplos sistemas de mundos, a presença de vida em outros lugares é coisa garantida. Isso sugere um paradoxo interessante: enquanto o mundo físico progride de sua fase primitiva, ou seja, da agregação de átomos e moléculas até a realização do seu completo potencial com o surgimento do mundo macroscópico e da vida senciente, por outro lado, degenera ao longo do tempo.

Extraído do livro  Science And Philosophy In The Indian Buddhist Classics que  em breve, será publicado  português.


NOTA:

[i] Os cinco são: 1. degeneração do tempo: a existência de disputa [guerra]; 2. degeneração da duração da vida: atualmente a vida útil está se tornando mais curta; 3. degeneração da percepção correta: a dificuldade de transformar a visão errônea [pervertida]; 4. degeneração da aflição: uma forte concepção de um eu ou entidade intrínseca permanente [egocentrismo]; e 5. degeneração dos seres: dificuldade de subjugar a mente e as faculdades sensoriais [dos quais dependem as aflições mentais].

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